sexta-feira, 20 de agosto de 2010

Amor Veneris


O descobrimento de Mateo Colombo surge, precisamente, quando os âmbitos das mulheres - sempre da porta para dentro - começam, pouco a pouco e subtilmente, a sair dos muros dos beatérios e dos monastérios, dos prostíbulos ou da tépida, mas não menos monástica, doçura do lar. A mulher, timidamente, atreve-se a discutir com o homem. Com algum exagero, chegou-se a dizer que no século XVI é travada a "Batalha dos sexos". Verdade ou não, a questão das incumbências das mulheres instala-se como um tema de discussão entre os homens.

Em tais circunstâncias, o que era a "América" de Mateo Colombo? Certamente, o limite entre descoberta e invenção é muito mais difuso do que parece à primeira vista. Mateo Colombo - é hora de dizer - descobriu aquilo com que todo o homem sonhou alguma vez: a chave mágica que abre o coração das mulheres, o segredo que governa a misteriosa vontade do amor feminino. Aquilo que, desde o início da História, foi procurado por bruxos e feiticeiras, xamãs e alquimistas - mediante a infusão de toda a sorte de ervas ou o favor de deuses e demónios -, aquilo, enfim, que todo o homem apaixonado sempre ansiou, ferido pelo desamor do objecto dos seus desvelos e da sua desdita. E também, aliás, aquilo com que os monarcas e governantes sonharam, pela mera ambição da omnipotência: o instrumento que subjugasse a volátil vontade feminina. Mateo Colombo buscou, peregrinou e, finalmente, encontrou a sua "doce terra" desejada: "o órgão que governa o amor nas mulheres". O Amor Veneris - tal é o nome com o que o anatomista o baptizou, "se me é permissível dar nomes às coisas por mim descobertas" - constituía um verdadeiro instrumento de potestade sobre o escorregadio - e sempre obscuro - arbítrio feminino. Por certo, tal achado apresentava mais do que uma aresta: "Com que calamidades a cristandade não se veria confrontada se as hostes do demónio se apoderassem do feminino objecto do pecado?", perguntavam-se, escandalizados, os Doutores da Igreja. "O que seria do rentável negócio da prostituição se qualquer pobre entrevado pudesse ganhar o amor da mais cara das cortesãs?", perguntavam-se os ricos proprietários dos esplêndidos lupanares de Veneza. Ou, ainda pior, o que aconteceria se as filhas de Eva descobrissem que trazem no meio das pernas as chaves do céu e do inferno?


O Anatomista, Federico Andahazi

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